Principais desafios para a compra da LIM pela AZUL, se ela ocorrer



ANÁLISE
Desde o início da semana, circula pela grande imprensa e pelo mercado de capitais os rumores de uma possível compra da LIM pela AZUL. Embora não impossível, há muitos desafios a serem traspassados para que isso ocorra. Depois do anúncio de uma parceria entre as empresas no mês passado, começaram os rumores sobre uma fusão ou compra de uma por outra. O mercado ficou agitado nos primeiros dias, mas depois se acalmou. E assim continuou, até o Bradesco publicar, nesta última semana, um relatório que considera como “o cenário mais provável” a compra da LIM por sua rival AZUL Linhas AéreasMas, além da parte financeira, mercadológica e especulativa, existem alguns motivos mais técnicos e interessantes que podem desafiar a compra ou fusão das empresas. Vamos listá-lós a seguir.

FROTA 
    O ponto a se considerar é a frota das empresas, que também está relacionado com a sua formação. O que de início pode parecer uma solução (afinal de contas, ambas voam Airbus), pode ser, no final, um grande quebra-cabeça para a gestão. 
    A Azul tem os ATR com 70 assentos, os E195-E1 com 118, os novos E195-E2 com 136, os A330-200 com 242 ou 271 assentos, e os A330-900neo com 298. 
    Na LIM ela opera com os Boeing 737-700 com capacidade para 146 assentos. O fator positivo é que ambas operam com os modernos jatos A320neo e com pedidos para chegarem mais. Entretanto para suprir a saída dos 737-800, a LIM opera atualmente com o A320ceo, o modelo tradicional da Airbus, todos ex-Avianca. 
    Óbvio que não é impossível e já vimos grandes fusões e aquisições no passado, mas é um pesadelo logístico (e custoso) planejar uma malha, escala de tripulação e comercializar passagens com uma frota tão diversa, além, é claro, dos gastos com manutenção, com treinamento de tripulantes para poderem voar o maior número possível de aviões para facilitar a escala, com compra de equipamentos das mais diversas funções, entre outros.

HUBS
A LIM tem seus principais hubs em Brasília e uma pequena parte em Guarulhos. Já a Azul, em Viracopos e Confins. E eles se sobrepõem muito atualmente (ao menos, antes da pandemia). Praticamente toda a malha internacional da LIM está em Guarulhos, enquanto a Azul mantém a maioria em Viracopos. Embora esta última distribua alguns voos para Confins e para Recife, a LIM antes da pandemia distribuia alguns voos para  Brasília e Fortaleza. Ter operações em Guarulhos e em Viracopos resultaria em sobreposição de mercados, de forma que haveria a necessidade de escolha de um dos dois. O peso maior fica para Guarulhos, que está muito mais próximo do maior mercado do Brasil, que é a capital paulista, enquanto que Campinas poderia ser apenas um hub secundário, mais fácil para moradores do interior paulista e sul mineiro. Um outro embate fica em torno de Brasília e Confins, que são os hubs das companhias voltados para voos diretos com o Centro-Oeste e parte do Norte/Nordeste. A sobreposição é grande e somente um grande exercício de sinergia poderia chegar a um denominador que fizesse sentido financeiramente. Possivelmente, seria privilegiada a escolha de um dos dois como hub principal.

CULTURA
As duas empresas possuem culturas muito distintas, sejam operacionais ou no atendimento ao cliente. A LIM é uma empresa que tem adotado, em parte, práticas comuns a empresas de baixo-custo, iniciando vendas à bordo, focando em promoções, voando com aviões em configurações mais densas e simplificando seu produto. Já a Azul vai na outra direção: investe em serviço de bordo, em entretenimento a bordo com TV e Wi-Fi, maior espaço nas aeronaves, possui um programa de pontuação que é de mais fácil “ascensão” que o da LIM e dá mais benefícios a partir de níveis mais baixos. Toda esta filosofia da Azul é focada em conquistar e fidelizar o cliente. Claro que isso tem um preço e a empresa acaba conhecida por ter as maiores tarifas do setor. Este confronto de culturas é sempre um desafio, já que os funcionários teriam que se adaptar e haveria custos para adequação, o que no final acabaria por virar uma nova cultura, ainda que o nome de uma das duas companhias prevalecesse e o outro sumisse. 

CONCLUSÃO
Por mais que todos estes aspectos possam ser considerados “pequenos” diante da fatia de 62% que as duas empresas podem ter juntas, são fatores com impacto a serem considerados. Duas empresas grandes, ao se juntarem, costumam formar uma nova empresa, de forma que a absorção por completo por apenas uma parte é complicada e trabalhosa. Os pontos acima são certamente considerados numa negociação e podem, sim, gerar uma barreira. Um dos exemplos mais claros é o salário: a Avianca Brasil tinha o maior salário de todo o país, de forma que, durante seu fracassado plano de Recuperação Judicial, a empresa seria dividida e transformada em Unidades Produtivas Isoladas, as famosas UPIs, nas quais os funcionários teriam novos contratos e novos salários alinhados com a empresa que controlaria a UPI. No futuro, a UPI seria integrada à companhia aérea compradora de maneira “natural”, sem herdar nenhum passivo de dívida. Por este motivo, AZUL, LIM, GOL e LATAM se interessaram muito no modelo, que não deu certo por outros credores e outros fatores. Logo vale sempre olhar além dos fator dinheiro ou pelo “valuation” baseado no fluxo de caixa futuro. Num caso como esse, nem tudo é dinheiro na mão. Duas empresas se transformarem em uma é uma espécie de casamento, os dois lados largam suas vidas para começar uma nova, juntos. É necessário não apenas estar “apaixonado”, mas conhecer a pessoa e ter os mesmos objetivos, senão, a chance de acabar em brigas e divórcio é enorme.

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